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Cleveland Prates

Entrada do país na OCDE reduzirá interferência do Estado e trará eficiência

Cleveland Prates

30/01/2020 04h00

Neste mês, o país recebeu apoio explícito dos EUA para a entrada na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A instituição é reconhecida no mundo inteiro pela sua competência técnica e seu compromisso com valores democráticos, liberais e com preceitos que busquem elevar a produtividade na economia, visando melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.

Os críticos da decisão do Brasil de pleitear sua entrada neste seleto grupo apontam para supostos dois problemas. O primeiro é que o país terá que se abster no futuro de pleitear Tratamento Especial e Diferenciado (TED) no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Já o segundo, relaciona-se à necessidade de que nossas políticas públicas sigam os preceitos negociados na OCDE, limitando o grau de interferência do Estado na economia e reduzindo práticas relacionadas a controle de importação, fluxos de capitais e taxa de câmbio.

É claro que toda decisão na esfera econômica sempre incorpora um componente de análise de custo-benefício. Mas neste caso, o resultado líquido é nitidamente positivo. Em primeiro lugar, porque há, no mínimo, sérias dúvidas sobre a efetividade do acesso privilegiado a mercados obtidos por meio de tratamento diferenciado (ver, por exemplo, Special and Differential Treatment for Developing Countries – http://cep.lse.ac.uk/pubs/download/dp1415.pdf), principalmente no caso brasileiro. Se vale a ideia explícita contida no Grupo de Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), de que o TED é uma forma de induzir a diversificação e o desenvolvimento econômico de países mais pobres, o que observamos, na realidade, são alguns poucos setores beneficiados, sem que haja clareza sobre os efeitos gerados para o resto da economia.

Por outro lado, nossas decisões de política econômica que foram contrárias aos preceitos definidos na OCDE nos levaram à perda de produtividade, descontrole das contas públicas, com períodos de hiperinflação, e mais recentemente ao nível de estagnação econômica que ainda vivemos. Ao contrário de quanto argumentam os críticos, ao minimizar a atuação do Estado para situações que visem corrigir falhas de mercado e ao abrirmos a economia, o efeito será a elevação da nossa capacidade de crescimento no médio e longo prazos.

Adotar os preceitos contidos na OCDE, que sempre ocorre de maneira gradativa, negociada e supervisionada, implica realizar boas reformas trabalhista e do Estado, além de nos comprometermos com as melhores práticas no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. E para aqueles que ainda rotulam a entidade de "neoliberal", há sempre recomendação e cobrança de políticas públicas direcionadas para a melhoria de indicadores sociais nas áreas de saúde, educação e meio ambiente. E tanto isso é verdade que, por exemplo, em seu relatório de avaliação das políticas públicas do Brasil de 2018 houve fortes recomendações de deslocar mais recursos de transferência de renda aos pobres, como Bolsa Família, e intensificar o combate ao desmatamento.

Longe de ser um órgão ideológico, a OCDE é um centro de estudos que tem por objetivo identificar políticas públicas que deram certo e sugeri-las para países membros e para aqueles que participam como convidados. E o objetivo dessas políticas é aumentar tanto a eficiência do setor público como estimular ganhos de produtividade no setor privado.

Assim, o ingresso do país na Organização pode nos dar uma espécie de "selo de qualidade de boas políticas públicas", facilitando a melhoria de nossa nota com as agências internacionais de avaliação de risco e, consequentemente, a captação de investimentos estrangeiros – principalmente o dinheiro de fundos institucionais que possuem regras que limitam a aplicação de recursos em países com baixa avaliação com agências de risco.

Vale finalmente ressaltar que a entrada na OCDE não é algo que aconteça de uma hora para outra. Ao contrário, este é um processo gradativo, que, no caso brasileiro, vem sendo construído há mais de uma década. Na realidade, o país já tem integrado as atividades dos comitês técnicos do organismo, com a presença de especialistas em reuniões de grupos de trabalho e seminários, como é o caso da área de defesa da concorrência.

Sobre o Autor

Economista especializado em regulação, defesa da concorrência e áreas correlatas. Atualmente é sócio-diretor da Microanalysis Consultoria Econômica, coordenador do curso de regulação da Fipe e professor de economia da FGV-Law/SP. Foi Conselheiro do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e secretário-adjunto da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.

Sobre o Blog

Este blog foi criado com o objetivo de propor um debate mais racional sobre temas econômicos que, em última instância, afetam o nosso cotidiano. A ideia central é analisar decisões governamentais e judiciais que possam implicar algum impacto sobre os incentivos gerados no setor privado e sobre o crescimento econômico do país.